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  • Alexandra Mettrau

AMOR DA ESPERANÇA

Atualizado: 4 de mar. de 2022

É um dilema comer laranja… Não é que descascar dá trabalho, é que mela tudo e deixa o cheiro na mão que parece que nunca mais vai sair. Cheiro de laranja é bom! É, mas não é exatamente esse cheiro. É cheiro de casca, com um amarguinho que aperta a língua. É cheiro que invade, cheiro que ultrapassa, cheiro que não sai e que não vai embora. De noite, depois de tomar banho, na cama deitada, me viro, a mão passa perto do nariz e lá está: cheiro de laranja descascada, amarguinho que aperta a língua.


Frescura! É, frescura e eu me pergunto porque? Sempre gostei de laranja. Aliás, sempre gostei de praticamente todas as frutas, mas algumas tenho preguiça de comer. Como eu gosto de frutas bem maduras, a maioria mela porque tem muito sumo. Fico com água na boca só de pensar em dar uma mordida numa fruta bem suculenta e sentir o sumo escorrendo pelo canto dos lábios, mas me dá um pouco de nervoso ficar toda melada e sujar tudo em volta.


Tem frutas que o prazer é maior do que o nervoso. Uma lima da pérsia ou um grapefruit são irresistíveis! Uma laranja lima eu passo. A não ser que alguém descasque para mim…


Aonde me levam essas frutas? Quando eu era pequena tinha a Esperança, fiel escudeira de minha bisavó, pequena, velha, preta, mas jeitinho de moleca e que me ensinou a comer de tudo. Me mimava e me cuidava como se eu fosse sua neta. E me dava laranja para comer escondido quando eu tinha piriri. Me pego agora sorrindo e chorando de saudade. Incrível, mas a imagem, a face, o jeito, o amor são inesquecíveis, intactos. No quintal da casa da Bisa, a Esperança me alimentava, me deixava brincar, descascava laranja para mim. Nem sei lembrar de um momento exato, apenas sinto a presença onipresente em toda a minha vida dessa mulher que me ensinou a comer de tudo, que me cuidava e me alimentava. E me amava. Às vezes o amor dói. Às vezes dói saber que eu nunca pude dizer o quanto ela foi importante. Será que ela sabia? Será que ela pode me perdoar por não ter cuidado dela como ela cuidou de mim? Será que ela via o brilho no olho da menininha de 4 anos comendo laranja escondido, que dizia que ninguém podia ser mais especial do que ela que era a única que ganhava a laranja descascada da Esperança? Será que ela sabe que a menininha ia se tornar uma mulher que ia amá-la para sempre? Quando a gente cresce e não consegue retribuir, para onde vai o amor? Será que quando eu choro agora, por não tê-la mais por perto, por não poder dizer o quanto ela foi e é importante, lá no céu das sábias feiticeiras alquimistas, que transformam substância em amor que nos alimenta, ela ouve e sente meu coração e minhas lágrimas?


Eu penso que o amor que a gente não pode mais expressar fica numa bolha atrás do cérebro, para gente não ver, não ouvir, não sentir… De vez em quando vêm lembranças e saudades, mas o amor fica na bolha só esperando o dia em que, descascar uma laranja lima se torna a gota d’amor que faltava para fazer transbordar a bolha e causar uma inundação de saudade!


AQUARELA

Alexandra Mettrau - Amor da Esperança



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