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  • Alexandra Mettrau

SEGREDOS DE UMA ROSEIRA


Eu gosto muito de passear ao ar livre e os dias de outono aqui no Rio de Janeiro são particularmente propícios para isso: céu de um azul límpido, vegetação plena, tapetes coloridos de folhas e pétalas pelo chão, clima seco e ameno, enfim, uma natureza que, apesar de estar se preparando para encerrar um ciclo anual, não muda tão drasticamente quanto nos países temperados e frios, pois serena, ao invés de morrer.


Outro dia ia eu apreciando a beleza outonal quando me deparei com duas figuras, no mínimo raras, que me chamaram a atenção: um senhor careca, sentado na posição de flor de lótus, vestido como um sábio hindu que parecia Krishna saído do Baghavad Gita, admirando uma roseira e um jovem senhor, vestindo sobrecasaca azul e calças amarelas, parecendo o próprio Werther de Goethe, em carne e osso, que, ao invés de se suicidar, saiu do livro e amadureceu, vindo parar aqui para observar a mesma roseira, mas de forma muito diferente, pois ele olhava atentamente, desenhava, mudava de posição mirando-a de outro ângulo e desenhava novamente, tocava, cheirava, fechando os olhos para absorver melhor as sensações, muito lenta e atentamente, como se a estivesse escutando.


Não pude resistir e me aproximei. Fiquei algum tempo vendo esses dois personagens, que, apesar de não falarem nada, pareciam estar, de alguma forma, interagindo. Um misto de curiosidade e admiração me fazia vacilar entre contemplar a cena ou querer perguntar quem eram e o que estavam fazendo. Minha natureza respeitosa me dizia para não interromper o que parecia ser muito importante e requerer extrema atenção e paciência.


Esperei.


Werther, depois de algumas voltas ao redor da roseira, complementadas por observações com todos os sentidos e desenhos e anotações precisos, sentou-se e ficou só pensando durante um tempo, até que sorriu largamente, com um ar de quem de repente havia tido uma grande revelação e compreendido tudo!


Krishna ficou todo este tempo em posição meditativa, no início apenas contemplando a roseira, depois fechou os olhos por uma eternidade, até que se moveu e se virou atentamente para seu companheiro.


Eu não consegui me atrever a interrogá-los, mas o olhar caloroso e sorridente que trocaram ao final me deu a impressão de que ambos, cada um a seu modo, haviam decifrado todos os enigmas que uma roseira esconde. E eu, sem saber se sonhei ou se de fato encontrei esse sábio da antiga Índia e este erudito contemporâneo de Goethe, guardei no meu coração as muitas formas de escutar os segredos de uma roseira.


IMAGEM: Foto de Alexandra Mettrau

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